Introdução
O Direito Administrativo brasileiro tem como fundamento uma série de princípios constitucionais e legais que visam garantir uma atuação estatal pautada pela legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e, sobretudo, eficiência (CF, art. 37). No entanto, uma análise mais detida revela uma prática preocupante: a invocação superficial de princípios como justificativa para decisões judiciais e administrativas pouco fundamentadas. Seria essa uma forma de comodismo judicial e administrativo, em que a facilidade da argumentação principiológica substitui o rigor técnico?
A Superficialidade na Aplicação dos Princípios
Carlos Ari Sundfeld, em Direito Administrativo para Céticos, critica o uso ambíguo e pouco rigoroso de princípios no Direito Público. Segundo ele, muitas vezes, princípios são invocados como um “coringa argumentativo”, servindo para justificar decisões sem uma análise aprofundada do caso concreto. Essa prática, longe de assegurar a justiça e a racionalidade, mascara uma deficiência analítica e um comodismo intelectual por parte de juízes e gestores públicos.
A mera menção a um princípio, sem a devida contextualização, análise de consequências ou ponderação de alternativas, pode resultar em decisões arbitrárias ou ineficientes. O princípio da eficiência, por exemplo, exige que a administração pública e o Judiciário atuem de forma produtiva e econômica (CF, art. 37, caput). No entanto, decisões que ignoram critérios de economicidade ou que resultam em morosidade excessiva contradizem esse próprio princípio.
O Princípio da Eficiência e o Comodismo Decisório
O princípio da eficiência não se limita à mera produtividade burocrática; exige uma atuação qualificada, orientada para resultados e para a satisfação do cidadão. Contudo, é comum observar decisões judiciais e administrativas que, sob o pretexto de “respeitar princípios”, acabam por perpetuar a inércia ou a lentidão institucional.
Quando um magistrado ou agente público se abstém de agir com a devida diligência, ou quando invoca princípios de forma genérica sem examinar as peculiaridades do caso, configura-se uma espécie de “comodismo decisório”. Essa postura não apenas viola o princípio da eficiência, mas também compromete a credibilidade do Estado.
Omissão Judicial e Administrativa: Consequências Jurídicas
A passividade do poder público — seja no Judiciário, seja na Administração — pode gerar responsabilização civil e administrativa. A omissão, quando configura negligência ou descumprimento de dever funcional, pode levar à condenação por danos morais ou materiais (CC, art. 43; Lei nº 8.429/1992, art. 11). Além disso, agentes públicos que agem com desídia estão sujeitos a sanções disciplinares (Lei nº 8.112/1990, art. 132).
O comodismo judicial e administrativo não é apenas uma falha ética; é uma violação de deveres funcionais que prejudica a coletividade. Decisões superficiais, justificadas por uma aplicação descontextualizada de princípios, ferem a segurança jurídica e a confiança nas instituições.
Críticas à Aplicação Descontextualizada de Princípios
A doutrina jurídica tem alertado para os riscos da aplicação subjetiva de princípios. Como observa Barroso (2019), a utilização indiscriminada de princípios sem uma metodologia clara pode levar ao decisionismo judicial e à fragilização da normatividade das leis.
O título deste artigo — “Princípio é Preguiça?” — questiona justamente essa dinâmica. A invocação automática de princípios, sem fundamentação robusta, muitas vezes reflete uma aversão ao esforço analítico exigido pela boa técnica jurídica e administrativa.
Conclusão: Combate ao Comodismo e à Falta de Rigor Técnico
Os princípios do Direito Administrativo e Constitucional são essenciais, mas não podem servir como muletas para decisões pouco refletidas. É urgente combater o comodismo judicial e administrativo que se esconde por trás de argumentações principiológicas vagas.
O Judiciário e a Administração Pública devem assegurar decisões fundamentadas em análises sólidas, considerando não apenas os princípios, mas também as normas legais, os fatos e as consequências de suas escolhas. Só assim será possível resgatar a eficiência pública e a legitimidade das instituições.
Referências
- SUNDFELD, Carlos Ari. Direito Administrativo para Céticos. São Paulo: Malheiros, 2012.
- BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. São Paulo: Saraiva, 2019.
- Constituição Federal de 1988.
- Lei nº 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa).
- Lei nº 8.112/1990 (Estatuto dos Servidores Públicos Federais).